Este blog é dedicado ao bom rock feito nas décadas de 1960 e 1970 do século XX. Ocasionalmente também podem ser abordadas bandas e eventos de outras décadas.
quinta-feira, 13 de janeiro de 2011
DA CAPO (1967): GARAGEM E PSICODELIA
O segundo álbum do Love, Da Capo, foi lançado em março de 1967, dois meses depois do lançamento do álbum de estréia dos Doors, a banda que Jac Holzman contratou para a gravadora Elektra por recomendação pessoal de Arthur Lee.
O R&B pesado e psicodélico, as fantasias sexuais escancaradas e sua presença singular faziam dos Doors os naturais substitutos do Love como grande esperança da gravadora Elektra. E os Doors possuíam outra tremenda vantagem: eles estavam dispostos a fazer o que fosse preciso para construir uma forte legião de seguidores. Por outro lado, o Love era conhecido por sua notória intransigência: Eles não faziam turnês regularmente e raramente se aventuravam fora do circuito de Los Angeles. De fato, os caras do Love foram os pioneiros mestres das atitudes arrogantes do mundo pop, dez anos antes de Johnny Rotten. Um repórter que entrevistou a banda em 1966 concluiu que “apenas quando um grupo alcança o topo, a sua carreira deve refletir o que eles devem sofrer por serem continuamente rudes e desprezíveis com fãs e repórteres igualmente. Na minha opinião, o Love estará brevemente em muitas listas negras na indústria da música”.
Como já é sabido, quem apresentou os Doors a Jac Holzman (presidente da Elektra) e insistiu na contratação da banda foi justamente Arthur Lee. Os Doors foram contratados e, ironicamente, acabaram fazendo mais sucesso que o Love. Os Doors fizeram sucesso mundial, enquanto o Love continuou sendo conhecido apenas em Los Angeles. “Eu não esperava que os Doors fizessem sucesso. Eles abriam os nossos shows e eram ruins ao vivo”, revelou certa vez Snoopy. No filme The Doors, de Oliver Stone, há uma cena que representa como eram as primeiras apresentações dos Doors: Jim Morrison cantando de costas para o público, antes da apresentação do Love. Ray Manzarek, tecladista dos Doors, resume a admiração de Morrison pela banda de Arthur Lee: “No verão de 1966, Jim Morrison e eu fomos até o Whisky A Go Go [famosa casa de espetáculos de Los Angeles] e vimos um show do Love. Estava tudo preparado para os caras, e a banda estava simplesmente enfumaçando o local. Então, Morrison se virou para mim e disse: ‘Sabe, Ray, se os Doors pudessem ser tão grandes quanto o Love, minha vida estaria completa’”. O primeiro disco dos Doors foi lançado em janeiro de 1967 e todos sabem muito bem o que aconteceu.
Da Capo manteve a mesma verve garageira do primeiro álbum, mas havia um diferencial: o segundo registro fonográfico de Arthur Lee e seus amigos era uma coletânea de sonoridades encharcadas de ácido lisérgico. A psicodelia deu a tônica. Nas sessões de gravação, o novato Tjay Cantrelli assumiu a flauta e o saxofone e o novo baterista Michael Stuart assumiu as baquetas no lugar de Snoopy, que foi removido para os teclados. Da Capo tornou-se um LP notório por dois motivos: primeiro, por trazer a longa canção “Revelation”, de 20 minutos de duração, que ocupava todo o lado B do álbum (a primeira faixa de rock a ocupar um lado inteiro de um LP, muito antes do Pink Floyd) e por trazer “7 And 7 Is”, o maior sucesso comercial da banda (alcançou o posto 33 da parada nacional e sucesso absoluto em número de execuções nas rádios de Los Angeles durante várias semanas). Jac Holzman confiou a produção do álbum a Paul Rothchild depois que o presidente da Elektra concluiu a produção do single “7 And 7 Is”, nas sessões de gravação efetuadas em junho de 1966. Rothchild editou “Revelation” a partir de “quilômetros” de fitas magnéticas. “Arthur gostou da idéia de contar comigo como produtor”, diz Rothchild, “precisamente porque eu já tinha experiência em produzir faixas longas, como ‘East-West’ [The Paul Butterfield Blues Band] e ‘The End’ [The Doors]”.
As seis canções que fazem parte do lado A de Da Capo constituem alguns dos mais brilhantes clássicos do repertório do Love. “Stephanie Knows Who”, escrita sobre uma garota conhecida de Lee e Maclean (garota essa que também inspirou “The Castle”) inclui a primeira incursão da banda num interlúdio de free-jazz, como fica evidenciado pelos sopros de saxofone de Cantrelli em harmonia com o cravo tocado por Snoopy.
Nenhuma composição de Maclean é tão lírica quanto “Orange Skies”. Arthur Lee relembra: “Eu escrevia mais sobre a vida real. ‘Orange Skies’ era uma boa canção, mas eu tive que perguntar para Bryan: ‘Por que você não escreve sobre coisas da vida real? Por que você está sempre escrevendo sobre sorvete, essas coisas?’ Mas eu verdadeiramente o admirava. Ele era um grande compositor”.
“!Que Vida!” é construída sobre elementos variados: uma batida de ska nos versos, um órgão lounge e um sino de Natal na coda. Tais elementos exemplificam a crescente fascinação de Lee por um espectro de ritmos diferentes, tanto quanto seu questionamento lírico: “Can you find your way or do you want my vision?” (“Você pode encontrar o seu caminho ou você quer a minha visão?”), que sugere uma forte crença no seu poder como músico e poeta.
O punk rock “7 And 7 Is” (listado no álbum como “Seven And Seven Is”) foi lançado como single em junho de 1966. Nessa faixa, Lee exorciza os seus demônios com incomparável ferocidade. Basta considerar o estrago no final: um frenético solo de guitarra, o som da explosão de uma bomba atômica em uma área de testes em Nevada, e um segmento bluesístico que surge no final e vai sumindo aos poucos. Nada no Top 100 norteamericano de 1966 chega perto da esfuziante magnitude de “7 And 7 Is”. Como foi gravada quase um ano antes do lançamento do LP, a faixa apresenta Snoopy na bateria. O vigor retumbante da bateria e das guitarras é absolutamente único para um rock dos anos 1960, mas é a linha de baixo (a cargo de Ken Forssi) que, surpreendentemente, fornece o gancho melódico da canção. “Era sobre uma garota chamada Anita”, explica Lee. “Ela nasceu no sétimo dia e eu também nasci no dia 7, e sete e sete é. Simples assim. Eu morava em Sunset e acordava cedo todas as manhãs. A banda inteira estava dormindo. Eu entrei no banheiro e escrevi os versos da letra. Eu costumo compor minhas canções antes do amanhecer. Eu poderia ouvir as canções nos meus sonhos, mas se eu não me levantasse para escreve-las no papel ou se eu não tivesse um gravador ao meu alcance para registrar a melodia, eu perdia tudo, letra e música. Se eu confiasse que podia me lembrar da composição no dia seguinte – boink, já era”.
Talvez mais do que qualquer outra gravação, “7 And 7 Is” definiu a nova face do rock de Los Angeles em 1966 – libertado do mito do sonho californiano, da embusteira indústria fonográfica de Hollywood e, finalmente, da dominante influência dos britânicos. Este era o som das ruas – o novo som dos garotos alienados que se encontravam e que se enturmavam pelas ruas e desfiladeiros dos arredores de Sunset Strip. A canção é um ataque fulminante aos sentidos: um andamento vertiginoso, as guitarras de Maclean e Echols dedilhadas em ritmo frenético e os vocais furiosos de Arthur Lee quase gritando os misteriosos versos da letra: “You can throw me if you wanna, ‘cause I’m a bone and I go oop-ip-ip, oop-ip-ip, yeah” (“Você pode me arremessar se você quiser, porque eu sou um osso e eu vou upipip, upipip, iê!”). Apenas uma bomba atômica poderia parar toda essa loucura. Descrita como “uma obra-prima apocalíptica”, a canção tornara óbvio o fato de que o Love estava mergulhando de cabeça no mar de alucinógenos que era a Califórnia no começo do movimento hippie.
O lado B de “7 And 7 Is” é bem característico da maioria dos “lados B” dos singles dos anos 1960: “Nº Fourteen” é daquelas canções feitas para ajudar o disque-jóquei a decidir qual dos dois lados do compacto merece execução radiofônica. Comparando com “7 And 7 Is”, esta faixa perde de goleada. Mesmo assim, os fatores desiguais que compõe este single com menos de dois minutos de duração parecem convencer: uma estrutura poética simples, um coral marcial característico de fuzileiros navais, uma batida psicodélica semelhante à de Bo Diddley e um toque de country na coda. Ao contrário de “7 And 7 Is”, “Nº Fourteen” não foi incluída em Da Capo.
As experiências de Lee com assinaturas de tempo alcançam o seu zênite em “The Castle”, o hino composto por Lee em homenagem ao lar comunitário da banda. A canção começa com um segmento acústico dedilhado antes que o baixo aumente a velocidade da música e pare abruptamente. As definições dos propósitos dos instrumentos mudam com a melodia: guitarra e baixo se alternam como linha e tecido, até os dois encontrarem um solo de cravo, e a tapeçaria sônica está completa. Outro ponto alto da canção é a misteriosa letra: “Here’s my baggage, hand me my staff, I’m living in a boat, a plane or raft, oh… A my love, B I love, so hard to choose; If that were in my mind, It I would use, oh… Goin’ back to mother, leavin’ on the double, think I’ll go to Mexico” (“Aqui está minha bagagem, pegue para mim o meu suporte, eu estou vivendo em um bote, um avião ou uma balsa, oh... A meu amor, B eu amo, tão difícil de escolher; Se estivesse em minha mente, eu usaria, oh... Voltando para a mãe, partindo à toda pressa, acho que eu irei para o México”).
“She Comes In Colors” é difícil de ser batida no papel de reflexão temporal dos anos 1960: como atesta o verso nevoento de Lee, “When I was in England town, the rain fell right down; I looked for you everywhere ‘till I’m not around” (“Quando eu estava na cidade da Inglaterra, a chuva caía direto; Eu te procurei por todos os lugares até eu não estar mais por perto”). Uma nota musical importante é a introdução do samba no trabalho do Love por parte de Arthur Lee nesta canção, uma batida que fornece um pano de fundo viajante ao sopro espiralado da flauta.
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