Este blog é dedicado ao bom rock feito nas décadas de 1960 e 1970 do século XX. Ocasionalmente também podem ser abordadas bandas e eventos de outras décadas.
quinta-feira, 13 de janeiro de 2011
!QUE VIDA! - A HISTÓRIA DE ARTHUR LEE & LOVE
NÓS TODOS SOMOS NORMAIS E QUEREMOS A NOSSA LIBERDADE: A GÊNESE DO LOVE
O Love foi a banda que operou uma certa ruptura estética nos anos 1960. Eles tinham o visual, o som e a atitude de uma sociedade em mudança. As letras e as músicas de Arthur Lee cobriam o largo terreno de qualquer banda de rock. No decorrer de três álbuns, a formação original do Love gravou punk, suítes sinfônicas, easy listening, blues e folk. Enumerar as várias influências que se mostravam – ritmos caribenhos, guitarra espanhola, música flamenca, folk rock, free jazz, psicodelia, lounge, country, ska – seria um exercício infrutífero: O Love fez simplesmente de tudo musicalmente.
O Love foi a primeira banda multirracial de rock conhecida da primeira Era Psicodélica, a primeira banda de rock a assinar contrato com a Elektra (inicialmente, uma gravadora essencialmente de folk) e a primeira banda a gravar uma canção que ocupava um lado inteiro de um LP (“Revelation”, que ocupava todo o lado B de Da Capo, segundo LP da banda). Arthur Lee também foi o primeiro a gravar Jimi Hendrix em estúdio (produzindo o single “My Diary”, para a cantora Rosa Lee Brooks, em 1964, lançado pela Revis Records).
Lee e seus companheiros só se vestiam de forma chamativa e original. Desse jeito, eles definiram literalmente o senso de estilo da nascente contracultura hippie. A idiossincrática moda do Love englobava sapatos mocassins americanos, viseiras triangulares, calças listradas e casacos de pele que não mostravam presunção, mas uma nova sensibilidade (“Em termos de roupas”, explica Lee, “sem mim não haveria Jimi Hendrix e Sly Stone. Eu fui o primeiro negro a ser chamado de hippie”.). O mais importante de tudo era que a música do Love era ousada e original para os padrões daqueles tempos, uma honesta reflexão da visão de mundo única e da filosofia de Arthur Lee.
Conforme o Love surgia para o estrelato, em 1965, Hollywood estava deixando de ser apenas a cidade dos filmes e da TV para ser também o nascedouro da emergente contracultura jovem. Em clubes noturnos como Bido Lito’s, Brave New World e o legendário Whisky A Go Go, as pessoas enchiam as ruas da cidade por noites a fio para assistir às performances hipnóticas do Love. Uma dessas pessoas era um jovem chamado Jim Morrison, que estava começando os seus primeiros passos musicais, com a sua banda que viria a ser futuramente conhecida como The Doors.
Jac Holzman, o fundador da gravadora Elektra, viajou de Nova Iorque até Los Angeles unicamente para ver o grupo. Ele já pretendia fazer incursões dentro do campo do rock, mas as bandas pelas quais ele estava interessado – como The Byrds (que já havia lançado um single pela Elektra sob o codinome The Beefeaters) e Lovin’ Spoonful já haviam assinado contratos de longos períodos com outras gravadoras. “No clube Bido Lito’s eu fiquei realmente muito impressionado com a reação da platéia”, relembra Holzman. “Era uma multidão imensamente entusiasmada. A banda era arrebatadora no palco. Arthur estava de óculos escuros e ‘Hey Joe’ foi tocada de uma forma maravilhosa”.
O Love gravou quatro álbuns para a gravadora Elektra, dois dos quais – Da Capo e Forever Changes – tem sido universalmente reconhecidos como verdadeiros clássicos. Entretanto, a banda nunca alcançou muito sucesso para muito alem das fronteiras da sua cidade natal (Los Angeles) e de um significativo séqüito de fãs britânicos. Quando o assunto era fazer turnês nacionais, apresentações em programas de televisão e presenças em eventos promocionais, Arthur Lee simplesmente dizia “NÃO!”. Holzman se lembra de ter insistido para que os membros da banda voassem até Nova Iorque para promoverem a sua estréia em âmbito nacional – o que eles fizeram. Por um dia. Eles permaneceram em Nova Iorque durante um único dia. “Eles não concederam entrevistas à imprensa, não fizeram apresentações ao vivo e voltaram para Los Angeles”, disse Holzman, notando que o sucesso que a banda alcançou na Inglaterra nunca chegou a ser devidamente capitalizado. “Uma das razões pelas quais o Love não se tornou um sucesso mundial foi o senso insular de Lee”. Para ele, o mundo era apenas a California.
Lee acrescenta: “Nós éramos os mais populares – e os mais preguiçosos. Uma turnê pela Costa Leste? Esqueça. Nós estávamos indo bem em Los Angeles”. Em meados de 1967, Lee também recusaria um convite para se apresentar no Festival de Monterrey, citando divergências pessoais com um dos promotores do evento, Lou Adler (que também era um figurão da indústria musical em Los Angeles).
O Love acabou pagando o preço por isso, vendo os Doors, seus colegas de gravadora, roubando-lhes o posto de banda n° 1 da gravadora Elektra, enquanto muitas outras bandas capitalizavam em cima das inovações que Lee e seus companheiros haviam colocado primeiro em vinil. “Os Doors idolatravam Arthur Lee”, disse Paul Rothchild, que produziu o segundo álbum do Love, Da Capo, e os seis primeiros álbuns dos Doors. “Os Doors herdaram muita coisa do estilo do Love. Não há nenhuma dúvida a respeito disso”.
Ao mesmo tempo em que outras bandas psicodélicas estavam em decadência conforme se dissipava a névoa lisérgica, o ponto máximo da carreira do Love, o álbum Forever Changes, definia a década de 1960 tão bem quanto clássicos mais amplamente reconhecidos como Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band, dos Beatles, Pet Sounds, dos Beach Boys, e Their Satanic Majesties Request, dos Rolling Stones. Em uma eleição feita nos anos 1980 entre críticos de rock britânicos e norteamericanos, Forever Changes alcançou a posição de número 16 entre os melhores álbuns de todos os tempos.
Ao contrário de outras bandas psicodélicas da época, o Love não era uma banda arrogante. As letras de Lee retratam um tempo de extravagância, ainda que ele nunca tenha exagerado. Lee procurava maneiras de emular pessoas que ele considerava “os maiores entretenedores” – Jackie Wilson, Curtis Mayfield, Sam Cooke, Little Richard e James Brown. Quando cita os performers que mais admira, Lee é unânime em citar, entrevista após entrevista, as mais variadas fontes de inspiração, nomes como Jerry Lee Lewis, Beethoven, Tchaikovsky, Robert Johnson, John Coltrane, Jack Gleason e Miles Davis. Sobre este último, Lee é enfático: “’Sketches Of Spain’, de Miles Davis, é uma das coisas mais maravilhosas que eu já ouvi em toda a minha vida”.
Com essa admiração em seu coração e em sua mente, Lee tinha uma vantagem – ele era um estudante de canto, composição e performance. Essa é uma idéia corroborada pelo escritor Richard Meltzer (cujo livro Aesthetics Of Rock é um marco do final dos anos 1960) que coloca Lee não entre os poptars, mas na classe dos cantores/compositores primeiro conhecidos como poetas e depois como músicos – pessoas como Tim Hardin e Tim Buckley. “O ponto de vista de Arthur era absolutamente deslumbrante e único para a época”, disse Bruce Botnick, co-produtor de Forever Changes. “Ele e Bryan eram a mistura perfeita. O trabalho de Bryan era plangente e leve; Lee, por outro lado, era mais barra-pesada. Esses dois lados funcionavam tão bem quanto Lennon e McCartney”.
A influência do Love sempre foi poderosa. Robert Plant, vocalista do Led Zeppelin, sempre coloca o Love na lista de suas bandas favoritas. Plant citou Arthur Lee e a influência do Love em sua música no discurso proferido durante a cerimônia de integração do Led Zeppelin na Rock And Roll Hall Of Fame, em 1995. Além disso, bandas de estilos diversos como pop, hard rock e folk gótico tem gravado as canções de Lee e Maclean. Alguns exemplos: The Hooters (“She Comes In Colors”); UFO e The Damned (“Alone Again Or”); The Move (“Stephanie Knows Who”); Alice Cooper, Billy Brag e Ramones (“7 And 7 Is”) e Mazzy Star (“Five String Serenade”).
A influência do Love tem sido mais fortemente sentida em bandas pós-punk britânicas, especialmente nas bandas neopsicodélicas da metade dos anos 1980. Echo & The Bunnymen, Siouxie & The Banshees, Teardrop Explodes, The Monochrome Set e Orange Juice lideraram o seu próprio movimento que misturava acústico com elétrico, e ambiente com concreto, exatamente como Lee fazia duas décadas antes deles. O folk rock genérico e a atmosfera pop combinados com os trocadilhos surrealistas podem ser ouvidos também na música de Robyn Hitchcock, XTC e certas bandas shoegazer do começo da década de 1990, como Lush, This Mortal Coil e Inspiral Carpets. Em 1994, várias bandas contemporâneas (entre elas, Urge Overkill, Teenage Fanclub, Television Personalities e Love Battery) foram convidadas para homenagear Arthur Lee e o Love com covers que foram reunidas em uma coletânea intitulada We’re All Normal And We Want Our Freedom: A Tribute To Arthur Lee And Love (Alias Records). Aliás (sem querer fazer trocadilho com o nome da gravadora), essa coletânea é altamente recomendável a todos os fãs do Love.
Todas as canções contidas nessa coletânea da gravadora Alias foram pinçadas dos três primeiros álbuns do Love. Apesar da banda ter entrado no Top 40 apenas uma vez durante o auge das rádios AM especializadas em rock nos Estados Unidos e nenhum dos seus trabalhos terem recebido disco de ouro, há uma legítima reverência em relação ao trabalho do grupo que existe até os dias de hoje e continua a crescer a cada dia. “Essa música não tem sido explorada”, Lee explica, “porque eu tenho me recusado a cooperar. Eu nunca fui um campeão de vendas”.
A obra do grupo mostra o quão efetivamente e coerentemente o Love refletiu uma era transicional na história do rock. A Invasão Britânica estava arrefecendo; Os Beach Boys e os Byrds estavam mostrando o quanto uma diferença geográfica poderia resultar em perspectivas amplamente diferentes na música; e o soul, o blues e o pop estavam definindo as identidades das cidades e regiões dos Estados Unidos. Mas a música do Love era confluente. Eles poderiam se apresentar tocando o mesmo soul que as bandas de Detroit tocavam; Eles poderiam compor com a serenidade pessoal de qualquer cantor/compositor confessional; E eles poderiam narrar as complexidades do amor tão bem quanto qualquer outro artista do período.
“O Love tinha uma certa rusticidade”, diz o produtor Botnick. “Individualmente, eles não eram grandes músicos, mas, quando eles estavam juntos, havia uma mágica. E Arthur Lee era o ponto inicial de tudo. Eu nunca conheci alguém como Arthur Lee – antes ou depois”. Se toda a obra do Love consistisse apenas na voz de Lee acompanhada de um violão, ainda seria digna de toda a reverência.
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É triste que aquí no nosso Brasil, o pessoal até do Rock desconheça a obra de Arthur Lee, o verdadeiro músico que representa a Contracultura dos anos 60. Venho por meio desta parabenizar Willian duarte.
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