quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

FOUR SAIL (1969): UMA NOVA FORMAÇÃO NAVEGANDO NO ROCK PESADO



Lee reapareceu aparentemente recuperado do seu vício em heroína em agosto de 1968 com uma nova formação do Love. Desta vez, o investimento foi todo no rock pesado. O quarteto era Lee no vocal, Jay Donnellan na guitarra, George Suranovich na bateria, e o amigo de longa data Frank Fayad no baixo. Esse novo Love acabou gravando 27 canções que acabaram se transformando em dois álbuns. Dez faixas formaram o álbum Four Sail, da Elektra, o último do Love por essa gravadora, em setembro de 1969; As outras 17 faixas se tornaram Out Here, um álbum duplo lançado pela Blue Thumb, em dezembro. Nenhum dos dois álbuns entrou para o Top 100 norteamericano, mas Out Here se tornou um hit menor na Inglaterra, alcançando a 29ª posição entre os discos mais vendidos em maio de 1970.

Uma terceira formação do Love, com o novo guitarrista Gary Rowles e o baterista Drachen Theaker (ex-membro do Crazy World Of Arthur Brown) fez a primeira turnê do grupo pela Inglaterra, mas os fãs ficaram decepcionados pelo fato da banda não apresentar ao vivo a mesma magia existente nas gravações (Uma das primeiras bandas de Lee, The VIPs – que apresentava Arthur no órgão – também incluía Rowles, Suranovich, Fayad e o cantor/guitarrista Noony Ricket).

Drachen Theaker gravou com o Love apenas duas faixas de Four Sail (“Your Friend And Mine – Neil’s Song” e “Good Times”). Ele relembrou o estado de espírito da banda naquela época: “O Love soava como se fosse uma banda de soft rock se esforçando para fazer um som hard rock. Tudo estava centrado na casa de Arthur Lee, que era uma casa definitivamente psicodélica: no topo de uma montanha, com uma piscina que ficava com um dos lados para dentro e com o outro lado para fora da casa. Nós costumávamos ensaiar todos os dias, mas fazíamos apenas um ou dois shows por mês”.

As lembranças de Theaker são corroboradas por Jac Holzman, o fundador da gravadora Elektra, que disse: “Arthur foi um dos mais inteligentes e competentes músicos que já encontrei. Tão grande quanto o seu talento, entretanto, era a sua inclinação para o isolamento, o que o impedia de fazer o necessário para levar a sua música ao vivo até o seu público. Seu isolamento custou a sua carreira”. De fato, já foi sugerido que Lee seria um esquizofrênico fronteiriço. Certa vez, Holzman teria dito que “Arthur não é deste mundo”. O jeito com que ele conduzia a sua vida e a sua carreira, certamente, levava a essa conclusão.



Four Sail é o mais pesado dos dois álbuns, e deve ter sido bastante indigesto para os fãs devido à sua dramática diferença com Forever Changes. “As gravações não estavam dentro dos padrões [do Love dos primeiros tempos]”, diz Jac Holzman. A atitude de Lee também cumpriu a sua função. “Four Sail”, ele diz, “é uma caracterização tipicamente sardônica do lado mercadológico da música. Era sobre a minha música estar à venda (for sale) e os quatro (four) caras do Love indo embora (sailing away) da Elektra”.

Mais do que as canções de Arthur Lee, o eixo de Four Sail é a guitarra de Donnellan. Na antológica “August”, a faixa de abertura do disco, ele proporciona alguns riffs intensamente viajantes que conduzem o quarteto a uma intensa jam de encerramento. Lee toca piano, harmônica, guitarra rítmica e conga, mas é a sua performance vocal que se destaca. A voz de Lee se apresenta caracteristicamente melancólica sobre um intrincado fundo musical que deságua em uma poderosa jam psicodélica. Os quatro instrumentistas voam em alturas onde apenas o Cream já havia chegado antes. Embasados nesse som, o Love poderia ter se tornado uma das mais badaladas bandas psicodélicas do final dos anos 1960. Infelizmente, a indisposição de Lee para fazer apresentações ao vivo com regularidade (principalmente fora de Los Angeles) negou o acesso do Love ao Olimpo do rock (pelo menos naquele período).

“Only you can bring back the good old days” (“Apenas você pode trazer de volta os bons e velhos dias”), é o que canta um Lee aparentemente sentimental em “Your Friend And Mine – Neil’s Song”. A melodia otimista da canção desvirtua o assunto da letra; O “Neil” em questão era Neil Rappaport, um roadie do Love dos primeiros tempos que havia roubado a van e os equipamentos do grupo para trocar tudo por drogas. Rappaport morreu pouco tempo depois disso, de overdose de heroína.

Em seguida, temos “I’m With You”, uma faixa de dois minutos e quarenta e cinco segundos de duração, que dá lugar a “Good Times”, que apresenta outro bom solo de guitarra de Donnellan e que se mostra como uma canção com a arrogância de um jazzman confiante, hábil em trilhar tanto os caminhos do blues quanto os da exploração sônica em qualquer momento. Liricamente, a canção guarda uma certa semelhança com a magia de alguns dos primeiros trabalhos do Love, conforme Lee canta pouco mais do que “Gonna have a good time / No more bad times” (“Vamos ter um bom tempo / Não mais tempos ruins”).

“Singing Cowboy”, pelo contrário, apresenta um senso de inovação: a guitarra é impetuosa e as cordas possuem uma textura brilhante e etérea, diferente de qualquer outro trabalho do Love. O “cowboy cantante” era Jay Donnellan, que compôs a melodia. Lee compôs a letra honesta, com apenas um serpenteio de desapego. Depois de “Singing Cowboy”, aparece “Dream”, uma faixa de dois minutos e quarenta e nove segundos de duração.

A exemplo do que fez Paul Simon em sua canção “Richard Cory”, Lee desenha o retrato de um homem bom em “Robert Montgomery”, um cara que mora no lado mais refinado da cidade e se mistura com os plebeus. A natureza ambígua do protagonista é típica do Lee clássico. Lee diz que a canção foi escrita sobre si mesmo e um então recente amigo, Jerry Montgomery. A música flui com uma modéstia que equilibra as intenções líricas.

Depois de “Robert Montgomery”, temos “Nothing”, que, apesar do título, apresenta quatro minutos e quarenta e quatro segundos de duração. Essa faixa dá lugar à penúltima faixa do LP, “Talking In My Sleep”, uma canção de quase três minutos de duração.

“Won’t somebody please help me with my miseries?” (“Alguém, por favor, poderia me ajudar com os meus problemas?”), pergunta Lee em “Always See Your Face”, a faixa de encerramento de Four Sail. Esta é a única canção do álbum que guarda uma certa conexão com os primeiros trabalhos do Love – os metais, a pomposidade dos arranjos – e uma indicação de quanto Lee desenhava o formato e a textura de suas canções.

Nenhum comentário:

Postar um comentário